quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Juventude despedaçada: homicídios crescem entre jovens e negros


O equilíbrio do Pantanal também corre riscos diante da economia de mercado 
Nelson Urt
Navepress

Esta é uma imagem que captei na BR-262 no momento em que regressava pelo Pantanal do Mato Grosso do Sul, no caminho que liga a capital Campo Grande à minha cidade natal, Ladário, à beira do rio Paraguai, na linha de fronteira com a Bolívia. O fato é que há uma tênue linha invisível separando o que se vê e o que se sente neste pôr do sol e o que a sociedade de consumo nos impõe externamente. Mesmo o Pantanal, com sua beleza que parece infinita, corre tantos riscos quanto a Amazônia de perder seu equilíbrio e sua harmonia, e os que dependem dele para sobreviver também são passíveis de ameaças - há mineradoras trabalhando por perto.

Nesse sentido, a economia de mercado, com todos os seus tentáculos, visando o acúmulo de capital e o lucro a qualquer preço, tornou-se uma máquina muito cruel contra os homens e a natureza. E o preço maior está sendo pago pelas camadas mais pobres da população. Negros, jovens e pobres, mais precisamente.

Vejam os números do Atlas da Violência 2019, divulgados neste começo de agosto pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Números oficiais, científicos, nada de achismo, propaganda ou especulação política. 

O Brasil atingiu pela primeira vez em sua história o índice de 31,6 homicídios por 100 mil habitantes, correspondente aos 65.602 homicídios registrados em 2017.  São 179 mortes por dia. O correspondente a uma guerra a cada ano.

E, mais uma vez, a pesquisa comprova que o homem jovem, negro, com até sete anos de estudo, compõe o perfil das pessoas mais sujeitas a esse tipo de morte violenta intencional. A taxa de negros vítimas de violência cresceu 33% entre 2007 e 2017, em dez anos. Em 2017, eram pretas ou pardas 75,5% das pessoas vítimas de homicídio.

Quase 5 mil mulheres mortas violentamente no ano

O ano de 2017 registrou, também, um crescimento dos homicídios femininos no Brasil, chegando a 13 por dia. Ao todo, 4.936 mulheres foram mortas, o maior número registrado desde 2007 – sendo que 66% delas eram negras. Entre 2007 e 2017, houve um crescimento de 30,7% nos homicídios de mulheres no Brasil. 

O Ipea leva em conta um fator crucial para tanta disparidade: há um abismo de desenvolvimento humano entre os municípios mais violentos e os mais pacíficos do Brasil. E o que fazer para encurtar essa diferença? Esta é a questão que muitos preferem responder e combater de modo simplista, elegendo o tráfico e o consumo de drogas como maiores vilões da sociedade. Dentro desse raciocínio, basta aumentar as forças militares, aumentar o número de presídios e colocar mais polícia na rua para buscar a solução. Mas houve solução?

Muitos outros, como nós, defendem outro ponto de vista e dentro de uma nova postura. Uma educação de qualidade para todos, o acesso de todas as classes sociais  às moradias e aos bens de consumo e culturais, a preservação do meio ambiente, o culto às tradições históricas e patrimoniais e o respeito aos direitos civis no Brasil – são princípios chaves que precisamos cultivar para reverter esses números constrangedores que colocam nosso País como um dos mais violentos do planeta.

Campo Grande, a segunda capital mais segura

Se é que isso possa servir de conforto para a gente do Mato Grosso do Sul, Campo Grande ocupa hoje o posto de segunda capital menos violenta do País, com 18,8 homicídios por 100 mil habitantes, atrás apenas de São Paulo. Entre as cidades com mais de 100 mil habitantes em MS, Corumbá é a segunda menos violenta, vindo logo atrás da capital, com 29,6 homicídios por 100 mil, com 30 mortes violentas em 2017, apesar de se localizar na linha da fronteira. Ladário ficou com taxa estimada de 20,6, com 4 homicídios em 2017. 

Os municípios mais violentos de MS ocupam a faixa da fronteira com o Paraguai: são eles Paranhos (índice de 91,3), Antônio João (90,8), Ponta Porã (48) e Itaquiraí (67,8).  
Para se ter uma ideia desse abismo de desenvolvimento humano, entre os dez municípios menos violentos do País, todos do interior de São Paulo, os índices vão de 2,7 de Jaú até 8,5 de Sertãozinho.

Leia mais sobre o tema nesta reportagem do Universa:

https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2019/08/08/mulheres-com-filhos-mortos-pela-policia-vivem-medo-pelos-que-estao-vivos.htm



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