quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Ladário integra gente no coração da América

Feira de Ladário, 12 de agosto de 2015
Perto de mais um aniversário de Ladário, que completa 237 anos em 2 de setembro, voltei a percorrer um dos recantos mais visitados da nossa pequena notável cidade de 21 mil habitantes no coração da América: a feira livre. Nesse emblemático espaço em forma de cruz, que tem o Cristo Redentor como mirante ao sul e o encantador Pantanal ao norte, você fica sem saber quem é brasileiro e quem é boliviano. Mistura de etnias e culturas. E o que importa? O essencial é que vivem fraternalmente, felizes e em paz – atributos, aliás, cada vez mais raros em outros tantos territórios do planeta, onde guerras e miséria castigam corpos, corações e mentes. Percorro a feira e vejo o menino de olhar doce que fabrica um aviãozinho de papel. Ao lado, a corumbaense Rosa, aniversariante do dia, distribui sorrisos enquanto vende couve, rúcula, agrião e almeirão. Seu Chico espreme a cana na engrenagem e oferece a garapa fresquinha e gelada. Chiquinho vende leite caipira, queijo e mandioca, “produtos do Taquari”. Pequenos produtores dos assentamentos dividem espaço com bolivianos. Conversar com os hermanos bolivianos é como fazer uma viagem pela América do Sul: muitos deles vieram de La Paz, Oruro, Cochabamba, cidades ao pé da cordilheira dos Andes, nas alturas, onde o ar é tão rarefeito que pode causar desmaios nos visitantes. Aqui embaixo, readaptados, eles vivem como brasileiros, mas não perdem os traços típicos – as mulheres, conhecidas como “cholas”, vestem seus saiotes rodados, usam cabelos longos com tranças até a cintura, mantém os filhos sempre por perto, almoçam por volta das 10h o cozido de frango com legumes. Enquanto saboreio um fumegante pastel de carne à mesa debaixo de uma frondosa castanheira, penso e reflito que é exatamente este o verdadeiro espírito de integração dos povos do continente proposto quando criaram o Tratado de Roboré, nos anos 50, tornando livre o comércio na nossa fronteira com a Bolívia, mas nunca colocado em prática – os bolivianos são criminalizados por trazer produtos de Puerto Quijarro para vender em Ladário e Corumbá. E muito tempo depois criaram o Festival América do Sul, na tentativa de fundir a cultura sul-americana num só evento, mas que ainda hoje oferece espaço reduzido aos nossos vizinhos latinos. Não acredito que isso ocorra por falta de verbas, vontade política ou partidarismo, mas por puro eurocentrismo, interesses econômicos e negligência histórica. Enfim, resta-nos erguer um brinde a Ladário e um saludo à nossa América do Sul!

Fotos: Marilene Rodrigues







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